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20/05/2019 Desenvolvimento Humano

Jogar ou não jogar? Eis uma boa questão!

Começo minha escrita com as seguintes indagações, para refletirmos juntos: O ato de jogar não se trata de uma brincadeira apenas para crianças? A resposta mais adequada é: Depende!

É possível utilizar o jogo para solucionar problemas complexos, para criar, inovar ou contornar situações conflituosas em empresas, através de uma comunicação mais assertiva e efetiva? Com toda certeza!

Escrever é uma tarefa não conclusa, que se impõe tanto ao autor como ao leitor. A proposta desse artigo é trazer conceitos sobre jogo, chamar atenção para a importância do ato de jogar, e expor aplicabilidades em algumas atividades profissionais. Permita-me trazer algumas informações e reflexões relevantes sobre jogo sério e com propósito e os benefícios do seu uso entre adultos.

Definir o que vem a ser jogo não é tarefa trivial. Ao pronunciarmos a palavra jogo, pode gerar várias interpretações, modos diferentes de entendimento. Podemos pensar em várias categorias de jogos: Jogos de crianças, de adultos, de casais, de políticos, de animais.

Podemos nos lembrar de alguns jogos populares que permearam nossa infância, como o jogo da amarelinha, da cabra-cega, esconde-esconde, do garrafão. Nestes tipos de jogos, sempre havia uma forte presença de uma situação imaginária, de muita diversão e de regras estabelecidas, que permitiam o jogo fluir de forma democrática e inclusiva.

Gosto muito do conceito de jogo trazido por dois pesquisadores do assunto. Um deles é Johan Huizinga, que em seu livro Homo Ludens, traz o jogo como elemento da cultura e o conceitua como “uma atividade ou ocupação voluntária, exercida dentro de certos e determinados limites de tempo e espaço, segundo regras livremente consentidas, mas absolutamente obrigatórias, dotado de um fim em si mesmo, acompanhado de um sentimento de tensão e alegria e de uma consciência de ser diferente da vida cotidiana”.

O filósofo Jean-Jacques Rousseau nos trouxe a ideia de que “o homem joga somente quando é homem no pleno sentido da palavra, e somente é homem pleno quando joga”. Neste sentido, podemos pensar o jogo como algo que constitui o homem desde a tenra idade e que pode ser revivido na fase adulta.

Partindo desses pressupostos, o jogo e o ato de jogar devem buscar a associação do prazer, da alegria, da espontaneidade e o não-constrangimento. Deve haver liberdade para decidir entre jogar e não jogar, isso é lícito. É como se entrássemos consciente e inconscientemente em um círculo mágico de conversações, deixando para trás nossos problemas, preocupações e aflições do cotidiano, mergulhando em um outro universo, mais lúdico, leve, profundamente sério e suficientemente capaz de solucionar problemas complexos do nosso cotidiano.

Durante o ato de jogar, há uma tendência de nos sentirmos mais seguros, criando o ambiente onde nos autorizamos a correr mais riscos, sem maiores preocupações de expor uma opinião mais contundente, podendo imaginar o inimaginável, saímos da caixa e estamos mais propensos a realizar o que parecia impossível!

Muitos são os benefícios obtidos a partir do ato de brincar, de jogar: Jogar é algo atraente e motivador; inclui elementos de surpresa e incerteza, convidando-nos a criar estratégias de solução; contribui para o aprendizado, para o autoconhecimento e autodesenvolvimento; é um convite para avaliarmos nossas capacidades e habilidades.

Vou compartilhar com vocês um pouco da minha experiência com o uso do jogo. Iniciei a aplicação dos jogos nas minhas sessões de atendimento de Psicanálise com adolescentes e também com clientes em algumas fases de um processo de Coaching. Essas experiências, cem por cento vivenciais, surtiram resultados surpreendentes, pois através da linguagem do jogo, eles puderam se expressar de outra forma, de outro lugar, possibilitando exteriorizar afetos, emoções e sentimentos que se encontravam aprisionados em seu Ser, de uma forma mais fluida e com leveza, contribuindo para o aprimoramento da sua autopercepção.

Nessas experiências utilizei peças LEGO®, associadas a cartas que abordam temáticas variadas no que tange ao desenvolvimento humano e saúde psíquica, e também, jogos de tabuleiro. Essa combinação propicia a elaboração e construção de representações em 3D, de forma tangível e que veem expressar uma realidade complexa, seja no âmbito pessoal ou profissional, de forma prática e simples.

Os resultados positivos ficaram evidentes pelo feedback que recebi dos participantes dessas experiências e também pelas observações que realizei. Ocorreram mudanças na forma como essas pessoas veem a si e o mundo, propiciando uma (re)descoberta e um melhor entendimento das suas questões existenciais; esses fatos me motivaram a dar mais um passo.

Tive a iniciativa de ampliar minha escuta a respeito dos benefícios do jogo entre os adultos. Criei um espaço de diálogo experiencial, um espaço de trocas de afetos e de cocriação, contando com a participação de profissionais das mais diversas áreas. Através destes espaços participativos, de fala e escuta, coaches, profissionais de recursos humanos, psicólogos e terapeutas puderam ter contato com o jogo sério com propósito e os excelentes resultados obtidos dessa experiência foram muito positivos e transformacionais.

Segundo relatos dessas pessoas, após essa vivência eles expandiram seu nível de consciência sobre si e sobre suas interações com o mundo, promovendo uma reflexão sobre como eles poderiam aprimorar e desenvolver suas competências e habilidades, encontrando maneiras de aplicá-las de forma prática. Isso propiciou o surgimento de poderosos insights que emergiram a partir da fala e da escuta ativa de cada participante.

Nesse cenário, o jogo é percebido como um processo, como uma ferramenta de comunicação, uma linguagem universal, com propósito definido, que auxilia os profissionais envolvidos desde a resolução de problemas pessoais, profissionais e/ou organizacionais ao incentivo à criatividade, inovação e a melhoria da sua comunicação.

Sendo assim, é no brincar e no construir, entre metáforas e metonímias, entre significantes e significados e a partir da contação de histórias, que os participantes refletem sobre sua própria história de vida, escutando-se nas entrelinhas dos seus ditos e não ditos.

O jogo, quando bem contextualizado e aplicado, gera resultados exponenciais. Finalizo expressando que sou um entusiasta na aplicação do jogo entre os adultos. Os resultados são tangíveis e podem ser facilmente mensuráveis. Não existem mágicas ou promessas surreais, existem experiências vivenciais que são entrelaçadas em atos conversacionais, diante dos problemas complexos que vivemos na contemporaneidade.

Referências

HUIZINGA, Johan. Homo ludens: o jogo como elemento da cultura. 8ª edição. São Paulo: Perspectiva, 2014.
ROUSSEAU, J.J., Émile ou de l´´education, livro II, GF, 1996.

Colaboradores

Aurivan Sérgio

contato@aurivansergio.com.br