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01/11/2019 Capa

Ashram – Centro Internacional da Arte de Viver

Seja nas coisas materiais ou nas pessoas ao nosso redor, sempre buscamos paz e felicidade em elementos externos a nós. Quando isso não se concretiza, ficamos tristes, frustrados e não sabemos lidar com a complexidade das emoções. Ainda assim, encontrei um lugar onde tive ajuda no caminho para paz e felicidade genuínas. Lá percebi que estiveram todo o tempo dentro de mim. Esse lugar é o Centro Internacional da Arte de Viver, em Bangalore, Índia.

Minha primeira vez na Índia foi em 2016. Chegando lá, a área de desembarque internacional de Delhi já se mostrou peculiar. É um ambiente enorme, centenas de metros quadrados, com vários viajantes e funcionários caminhando e puxando malas. Até mesmo no banheiro fui pego de surpresa: um funcionário entrou, fazendo a limpeza antes que eu usasse e me entregou folhas de papel. A área da alfândega é outro ponto particular: há um painel enorme no qual se posicionam em sequência diversas esculturas de mãos, em diferentes tipos de mudras (gestos típicos da cultura védica para influenciar o fluxo de energia no corpo). Para uma pessoa sem alerta, sem consciência do mundo ao redor, esses detalhes poderiam passar despercebidos, mas eles me deixaram intrigado. Fui tomado pelo encantamento.

Entretanto, esse deslumbramento se transformou assim que comecei a caminhar pelas ruas de Delhi. Antes de tudo, a Índia é a comprovação irrefutável de que o mundo é feito de valores opostos. Passando por uma rua, há o item mais belo, detalhado, bem desenhado e colorido de todo o mundo. Mais à frente, está a coisa mais estranha e mal planejada. Há pessoas de índole altruísta e, de repente, há outras de comportamento egocêntrico. As maiores riquezas e pobrezas convivem lado a lado. O trânsito é caótico; à primeira vista, não parece existir qualquer lei de trânsito. Até me fez sentir falta do trânsito de Salvador! Ao mesmo tempo, é incrível observar tanto conhecimento em meio ao caos. As pessoas têm a habilidade preciosa de ver eventos como eventos, erros como erros, sem se apegar ao passado ou ao futuro.

A Índia é um país que te ensina, por bem ou por mal, que o momento presente é irreversível.

Quanto à cultura, a Índia é um país que abarca vários países em um só. É uma terra tão diversa que apresenta 22 idiomas oficiais, além de 1.600 não oficiais. Faz sentido imaginar um país extremamente múltiplo, com muitas cores e símbolos.

Navegar pelas ruas é uma aventura por si só. Dizem que quem tem boca, vai à Roma. Na Índia, talvez você não chegue à Roma, mas certamente alguém vai te levar para algum lugar. Os indianos têm a tendência de ajudar, mesmo que não saibam exatamente o que estão fazendo. Por conta disso, muitas pessoas acham difícil se comunicar, ainda que quase 10% da população fale inglês. De todos os lugares para os quais viajei, a Índia ainda é um dos locais mais cômodos para se comunicar, se você não souber falar a língua nativa.
Ao norte da Índia, minha primeira cerimônia foi um Ganga Aarti , (“cerimônia de luz”, em hindi), na cidade de Rishikesh . O aarti celebrado à beira do Rio Ganges é algo para se lembrar: performado por 20 pundits (cerimonialistas), nele se oferece o fogo como símbolo de purificação. Essa cerimônia é realizada nas cidades sagradas ao entardecer, e realmente senti que algo me conectou com ela. Algo se acomoda dentro do meu coração quando escuto os cânticos durante o Ganga Aarti.

Já viajando para o sul, passando pelas ruas de Bangalore e entrando no Centro Internacional da Arte de Viver (ou ashram ), é impossível não se impressionar com a visão monumental do Vishalakshi Mantap, a principal construção, com incríveis 1.008 pétalas de mármore branco; o Guru Paduka Vanam, um anfiteatro que comporta mais de 50 mil pessoas; a Annapurna Dining Hall, primeira super cozinha do país a receber a Certificação ISO 22000. O ashram é, com toda certeza, uma cidade dentro de uma cidade, um espaço de puro cuidado. Por sinal, merece destaque a palavra ashram , que significa “sem esforço”. Isso pode ser percebido facilmente ao viver neste lugar. Tudo é cuidado para você. Em alguns momentos, depois de passar semanas andando pelos mesmos caminhos, tive vontade de sair do Centro. Viajei por um tempo e, mesmo sem entender, percebi que gostaria muito de apenas voltar. As ruas da Índia significam agitação e desordem. O ashram significa calma e equanimidade. Valores opostos.

Essas descrições parecem irrelevantes perante a energia do lugar. Um lugar que acolhe pessoas independente de sexo, cultura, religião, cor ou idade. É se sentir natural e feliz, como uma criança. É elevação espiritual, alegria aumentada quando compartilhada com tantas outras pessoas ao seu redor. É expressar gratidão, não por algo ou alguém, mas por ter uma vida nesta Terra. É como estar em uma realidade paralela pensada por John Lennon, que por coincidência viu tantas vezes o Ganga Aarti. É um lugar indescritível, porque não há palavras que descrevam como é estar em casa.

Por fim, no ashram é possível ter a visão daquele que iniciou tudo: Sri Sri Ravi Shankar. Estar com ele é uma experiência única, pela primeira ou centésima vez. Dizem que estar na presença do Guru faz com que você expresse 100% daquilo que tem em si no momento. Senti isso com muita verdade; as pessoas se enchem de carinho, devoção e fazem o seu melhor para expressar todo esse amor. Isso acontece principalmente porque não existem barreiras quando há um coração devocional. Não há certo ou errado. Há simplesmente amor. E isso é a Arte de Viver.

Gabriel Lucio
Coordenador do Projeto de Ressocialização
da Arte de Viver, professor de yoga
gabrielucio@gmail.com

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