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05/11/2020 Arquitetura Viva

Ancestralidade Tecnológica

Partindo de um histórico de 3.8 bilhões de anos, a natureza já lançou milhões de “startups” e validou milhares delas. Uma das inovações que ela trouxe, não faz muito tempo, são as flores! Sim, as flores! A natureza estava um tanto “entediada” com seu “arsenal” e resolveu que deveria fazer um “upgrade” para se tornar mais diversa! Sendo assim, contratou alguns “arquitetos e designers” para melhorar essa performance e criar uma forma inovadora de aumentar a biodiversidade no planeta e revolucionar a quantidade de espécies que tínhamos até então! Dessa forma, há cerca de 100 milhões de anos, apenas, a natureza criou as flores, pense: uma flor tem um cheiro que atrai um tipo especifico de ser vivo, no mesmo local, outra possui coloração que atrai outro tipo. Dessa forma ao atrair uma fauna biodiversa, também atrai sua cadeia alimentar, esse novo ecossistema fará contribuições para formação de solos, mais fértil capaz de gerar e atrair novas formas de vida. Essa estratégia hoje conta com 90% de aprovação nesse método exponencial de aumentar a vida no planeta! Esse é um case de sucesso relatado pelo publicitário Fred Geli ao ministrar aulas de Biomimética que, no mínimo, é apaixonante!!! Inspirada por essa e tantas outras estratégias que a natureza cria, a arquitetura também deve observar e fazer uso de conexões capazes de otimizar a performance da vida no planeta e aumentando suas possibilidades construtivas!

Não apenas como no caso das flores, a natureza sempre trabalha pelo maior desempenho com o custo energético mínimo e projeta seguindo três princípios básicos:

01 – OTIMIZAÇÃO, por ser obcecada por economia, considera a preciosidade de cada recurso;
02 – CICLOS FECHADOS, ou seja, tudo é regido por um ciclo onde recurso e resíduo tem a mesma importância em momentos diferentes. Na verdade não existe lixo, esse resíduo gerado se torna insumo em um novo processo.
03 – INTERDEPENDÊNCIA, um princípio que rege tudo que é vivo no planeta, ou seja, tudo está conectado e todos os ecossistemas são afetados, com pequenas ou grandes intervenções.

Observando todas essas táticas e buscando, através da arquitetura, melhorar a nossa forma de atuar, ressignificamos as teias de formatação para nossos projetos, transformando-os em um meio de mudar o impacto da construção civil (consumimos 50% de recursos a mais que o planeta é capaz de regenerar) para o nosso planeta e para as pessoas! Sendo assim, fazemos uso de técnicas ancestrais (baseadas na natureza) para edificar com o menor impacto possível. Um dos métodos que vamos falar são as alvenarias em terra crua, esse insumo abundante e generoso, espalhado por todos os cantos!

Vamos começar com os tijolos de adobe, que tem em sua composição: terra, água e palha. Depois de feita a mistura desses ingredientes sob pisoteio, pegamos a massa e colocamos em fôrmas, os quais são desenformados logo em seguida, deixando-os secar ao sol. Em 15 dias temos tijolos prontos para se tornarem paredes. Essas paredes, como qualquer alvenaria em terra crua, são vivas, “respiram”! E devem receber rebocos ou qualquer outro tipo de revestimento, que as permitam proceder de tal forma.

Sua generosa espessura passa dos 20 centímetros, garantindo um bom resultado termo-acústico. Em termos de emissão de carbono, na fabricação, podemos contar com a expiração das pessoas envolvidas com a produção, ou seja, quase zero. Portanto, para que isso continue assim, buscamos fabricá-los com a terra do lugar onde será edificado o projeto. Caso essa terra não seja adequada por algum motivo, temos que contabilizar a pegada de carbono da logística de entrega da terra ou transporte dos adobes, caso sejam feitos em local distinto da obra onde serão utilizados.

Para as Taipas de Pilão, a técnica, o traço e a forma de execução, são completamente distintos. Usamos robustas fôrmas, bem estruturadas, para aguentarem a terra ser apiloada e assim que desenformamos as paredes já estão prontas, com altíssimo resultado estético, térmico e acústico. São paredes que tem aproximadamente 40cm de espessura e cujo traço é estabilizado com leve percentual de cimento, de acordo com o tipo de terra a ser utilizado.

Também chamada de ‘’Taipa de sopapo’’ ou ‘’Pau-a-pique’’, as alvenarias dessa modalidade são feitas com tramas de bambu ou madeira, onde o barro é arremessado dos dois lados e estruturado pela trama. Possui um resultado estético bem diferente do adobe ou da taipa de pilão, mostrando lindas características próprias da terra crua.
Além dessas, temos o COB, uma ecotécnica cuja massa se assemelha à massa do adobe, porém, ao invés de ser enformado, é rolado sobre uma lona até que adquira configuração de uma ‘’minhoca’’ com boa consistência, depois se assenta ‘‘minhoca sobre minhoca’’. Tem belíssimo caráter escultórico e também compartilha do bom desempenho termo-acústico das alvenarias de terra.

Já a estória mais recente e curiosa, é do ‘‘irmão mais novo’’ dessas ecotécnicas, o Superadobe, posteriormente melhorado e adaptado ao Hiperadobe. Ele nasce da ‘‘necessidade” de se construir na lua, pode acreditar! Na década de 80, a NASA lançou um concurso sobre “como construir na lua”, então o arquiteto iraniano, Nader Khalili propôs uma técnica simples, de construir usando materiais locais na qual consiste em ensacá-los e apiloá-los subindo a alvenaria, e acabou ganhando concurso. Esta técnica foi muito disseminada e hoje é bem conhecida em todo o mundo. Ela também conta com alto desempenho termo-acústico e possuí em torno de 40cm de espessura.

E agora é chegado o momento de unir ancestralidade à tecnologia! Depois de usarmos todas essas técnicas desenvolvidas por nossos ancestrais e baseadas na natureza, o desafio agora é pela mecanização de processos e otimização da mão de obra. A corrida atual no mundo é pela impressão 3D, que começa a ganhar corpo em vários lugares, fazendo uso de concretos e polímeros. O nosso desafio será imprimir em barro, biopolímeros e tantos outros bio-materiais que a gente ainda desconhece. É nesse lugar que queremos chegar!

Luana Lousa
Bioarquiteta
arqbiolua@gmail.com
Insta: @arquiteturaviva

Colaboradores

Luana Lousa

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