09/11/2018 Terceiro Setor
Educar para transformar, educar para o campo
Nesta edição da revista temos como tema central a educação e porque não conhecer modelos de formação diferentes e que acontecem em nosso Estado? Nesse artigo, vocês irão conhecer uma escola comunitária rural localizada no sertão baiano, a ESCOLA FAMÍLIA AGRÍCOLA DO SERTÃO – EFASE. Nossos entrevistados para essa matéria foram o professor Gabriel Troiler e a ex-aluna e técnica agrícola Racleci Andrade.
No geral, nosso entrevistado explica que as Escolas Famílias Agrícolas (EFAs) são escolas comunitárias, construídas e geridas por comunidades camponesas para garantir o acesso da juventude do campo à educação mais apropriada para seu ambiente de vida. Neste caso, os atores e espaços educativos vão para além da sala de aula. A família, a comunidade, as entidades e movimentos sociais se tornam colaboradores na educação dos jovens.
A EFASE é uma escola comunitária gerida pela Associação Regional da Escola Família Agrícola do Sertão – AREFASE, fundada juridicamente em 1997. A unidade física foi construída através de mutirão e a metodologia de ensino utilizada preza pela alternância entre o aprendizado em sala de aula e a prática nas comunidades onde vivem os alunos.
Um aluno da zona urbana está acostumado com uma dinâmica de ensino que não enfatiza a situação do campo. No entanto, um aluno que vive diariamente o cotidiano da zona rural, tendo pais agricultores, vivencia uma rotina de produção de alimentos diferenciada. Estes alunos praticamente vivem do que a terra fornece a partir do cultivo da mesma. Nesse cenário, a escola oferece uma educação contextualizada, ou seja, que leva em conta a vida desses jovens. Totalmente baseada na pedagogia de Paulo Freire, a escola tem por base uma vivência prática aliada às teorias.
Assim, os alunos passam quinze dias na escola e nesse período participam de aulas teóricas e práticas, além de cuidar do ambiente em que se acomodam, pois dormem nos quartos disponíveis. Sendo assim, limpam, organizam e se dividem em tarefas para manter o ambiente organizado. Durante estes quinze dias não tem acesso à televisão, ficando totalmente direcionados ao processo educativo. Atividades de lazer, voltadas para educação, também são realizadas. Nos outros quinze dias, os jovens retornam para suas respectivas comunidades exercitando o aprendizado do ambiente escolar.
Na Bahia existem 36 EFAs, e segundo o professor entrevistado, o papel de uma escola família é proporcionar uma formação apropriada e que esteja vinculada com a realidade de vida do campo. As EFAs promovem uma formação técnica e agropecuária com bases agroecológicas e populares, juntamente com a formação escolar de qualidade, além de propiciar uma formação humana e política para a juventude. Pois um jovem formado na EFA está capacitado tecnicamente e com compreensão política da sua realidade para intervir ativamente na mesma.
Mas o que isso tudo quer dizer? Que um técnico agrícola formado na EFASE está preparado para orientar uma produção de alimentos com base na agroecologia, ou seja, sem uso de venenos, assim como orientar a melhor forma de criação de aves, suínos, caprinos etc., também com recursos naturais, ou seja, sem produtos químicos para combater possíveis pragas. Além disso, por se tratar de uma escola no sertão com filhos de agricultores que enfrentam cotidianamente a escassez de água, os alunos são educados com práticas de reuso da água, através de inovações tanto para produção como para o consumo humano. A captação de água da chuva através de cisternas é um exemplo muito utilizado no semiárido nordestino atualmente.
Hoje a EFASE atende cerca de 480 jovens distribuídos no ensino fundamental, médio técnico e superior. Para tanto, necessita de estrutura que garanta a permanência dos jovens no espaço escolar: dormitórios, refeitórios, espaços de lazer e estruturas que garantam o aprendizado pela prática como setores produtivos agropecuários e laboratórios. Além de convênios realizados com a Secretaria de Educação, a escola conta com o apoio de seus ex-alunos e de doadores que compreendem a realidade do campo e apoiam essa iniciativa.
Racleci Andrade, que tem apenas 19 anos e já atua profissionalmente como técnica agrícola, afirma que “estudar na EFASE foi uma experiência ímpar, pois além de aprender os conteúdos (…) pode obter percepção básica sobre política e o quanto a educação contextualizada contribui para formar pessoas conscientes e humanizadas”. Imagina um mundo com pessoas preocupadas e capacitadas em produzir alimentos sem veneno pra todo mundo? As escolas rurais comunitárias são parte disso e na Bahia temos algumas, olha só que coisa boa!