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08/11/2018 Curiosamente

Motivação

Na edição anterior, caso você ainda não tenha lido, falamos um pouco sobre identidade cerebral, ou seja, como nossos hábitos ensinam o nosso cérebro a ser do jeitinho que é e demos dicas de como mudá-lo. Considerando que, para mudar, é necessário “querer”, somos automaticamente obrigados a fazer uma reflexão sobre motivação.

Quando falamos em motivação, em termos psicológicos, estamos falando das “[…] condições que existem dentro da pessoa, do meio ambiente e da cultura […] que explicam porque queremos o que queremos e porque fazemos o que fazemos”[1]. Assim, a motivação diz respeito ao “[…] estado interior de um organismo que dirige e instiga o seu comportamento de forma persistente e enérgica”[2]. Quando essa energia vem de dentro do indivíduo, é motivação intrínseca (e.g.: querer aprender inglês); quando vem de fora, é extrínseca (e.g.: ser forçado a aprender inglês). Mas, seja intrínseca ou extrínseca, essa energia tem um ponto de partida comum: as necessidades!

De forma sintética, todos temos necessidades e elas podem ser: a) Fisiológicas Básicas, quando são indispensáveis para a manutenção da nossa vida, como respirar; b) Psicológicas Básicas, decorrentes da nossa procura por relações que promovam crescimento pessoal ou bem-estar, como criar afinidades com os outros; c) Sociais Básicas, ligadas ao percurso histórico de socialização, como conquistas profissionais e exercício do poder.

Perceba que o primeiro passo para mudar de comportamento ou ajudar alguém a mudar é saber o tipo de necessidade que move o processo. O segundo é delimitar o tipo de motivação decorrente desta necessidade e o terceiro é manejar os níveis de satisfação envolvidos na tarefa. Além de nos mobilizar para a ação, em função do desequilíbrio que provoca em nosso organismo/ser, saciar uma necessidade gera prazer e este influencia os níveis de engajamento, promovendo enfraquecimento, fortalecimento ou surgimento de novos comportamentos.

O prazer, como dizia Epicuro, filósofo que viveu entre 341 e 270 a.C., “[…] é o princípio e o fim último da vida feliz. Nós sabemos que ele é nosso bem primeiro e congênito; dele partimos em qualquer ação de escolha e de rejeição, e a ele nos reportamos ao julgarmos todo bem com base nas afeições assumidas como norma”[3].

Epicuro tinha razão. Nossas ações, de certa forma, sempre são motivadas pela busca do prazer e pela fuga do sofrimento. Isto ocorre em função da ligação que existe entre necessidade, emoção e prazer. Assim, o movimento motivado que vamos fazer frente a uma tarefa, disparada por uma necessidade, pode ser de aproximação do prazer – e neste caso estamos falando do conjunto de estruturas cerebrais que promovem a ativação comportamental – ou de fuga do sofrimento – que ocorre a partir das estruturas responsáveis pela inibição comportamental.

O processo de inibição comportamental está associado ao nosso histórico de emoções negativas e sua finalidade é barrar comportamentos que podem nos gerar dor e sofrimento. Já o processo de ativação comportamental ocorre a partir das emoções positivas e favorece comportamentos que podem gerar recompensa. Logo, podemos deduzir que a “[…] motivação é uma medida, obtida por cálculos conscientes ou inconscientes, da satisfação que o cérebro poderá obter com um comportamento qualquer, seja brincar, trabalhar, namorar ou ler um livro”[4].

Em nosso cérebro esse cálculo ocorre a partir do conjunto de estruturas responsáveis por nos proporcionar prazer ou bem-estar, sempre que temos um comportamento que satisfaz uma necessidade. Este conjunto recebe o nome de Sistema de Recompensa. Este Sistema é um dos principais motores da motivação. Ele conta com uma poderosa memória para armazenar prazeres associados a comportamentos passados, o que nos possibilita imaginar prazeres futuros e avaliar o grau de satisfação que poderemos obter em qualquer atividade.

Saber o que é motivação e como criar um ambiente para oportunizar seu surgimento é fundamental para alcançarmos nossos objetivos. Por isso, se pergunte quais são suas necessidades, o que lhe dá prazer e busque motivação a partir disso; mas, acima de tudo, quando decidir fazer algo, mesmo que por obrigação, procure achar um motivo pessoal para fazer o que está fazendo e use algum tempo para imaginar todo o prazer que terá depois que concluir um ciclo de tarefas e conseguir mudar de comportamento.

Espero que você tenha gostado das reflexões que compartilhamos e, caso queira saber mais, dê uma olhadinha nas referências citadas. Dúvidas e sugestões: profmiguelead@gmail.com

REFERÊNCIAS

[1] REEVE, J. Motivación y emoción. Tradução Susana Margarita Olivares Bari e Gloria Estela Padilla Sierra. 5. ed. Cidade do México: McGraw Hiil, 2010. p. 18.

[2] FEINSTEIN, S. A aprendizagem e o cérebro. Tradução Lígia Teopisto. Lisboa, PT: Instituto Piaget, 2011. p. 350.

[3]NICOLA, U. Antologia ilustrada de Filosofia: das origens à modernidade. Tradução Maria M. de Luca. São Paulo: Globo, 2005. p. 108.

[4] HERCULANO-HOUZEL, Suzana. O cérebro em transformação. Rio de Janeiro: Objetiva, 2005. p. 95.

Colaboradores

Miguel Dourado

miguelserradourado@gmail.com