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02/11/2020 Contos de Família

Família: Sinônimo de Amor

Nesse ponto de partida, me vi em um dilema: como iniciar a minha escrita. Falar de mim, da minha família, de como se constituiu, os desdobramentos dessa formação e todo o processo… Mas porque toda essa dúvida de como abordar?

Seria tão fácil assim falar sobre? Hoje talvez sim, para a mulher que me tornei no auge dos meus bem vividos 34 anos…

Mas e se fosse há tempos atrás? Não! Não seria tão fácil assim, por que afinal a minha família não seguiu os padrões legitimados pela sociedade tradicionalista.

A forma como a adoção é vista e vivida tanto por alguns daqueles que estão inseridos no processo quanto aos espectadores, nem sempre tem a beleza que o ato sugere. Adotar, em seu conceito consiste em: “optar por; assumir, seguir; e trazendo para o significado jurídico: aceitar legalmente (alguém) [como filho], concedendo-lhe direitos; perfilhar; ainda assim há um preconceito enraizado por pobres de espírito que preferem olhar para o negativo (o abandonado com desmerecedor) do que ver o ato pelo lado generoso, altruísta.

Mas para mim, sintetizo o significado de forma diretiva e singela: dar uma oportunidade de saber o que é AMAR àquele que teve tal direito negado!
Então, reparto com vocês uma parte de minha história e de como aprendi o que é amar.

Ao que me contam, minha mãe (do coração) não podia conceber uma criança, mas antes de mim já havia oportunizado outros dois seres: minha irmã mais velha que havia sido “dada” por sua mãe – essa era uma prática normalizada entre mulheres que moravam no interior, que por vezes pariam de maneira indiscriminada e entregavam seus filhos por não poderem criá-los, alguns para adoção, outros para fins trabalhistas – e meu irmão (do meio, rs) que era filho biológico do meu pai (de coração). Eis que cheguei! Aliás, fui trazida para a cidade onde resido. Nascida em Alagoinhas, abandonada no hospital, recebi de presente dos céus um lar e mais que isso, uma família.

Cresci e em minha primeira infância, num mesmo período que ocorrera um trauma físico/psicológico, fui chamada por uma tia para um diálogo que consistia em abrir para mim a minha história… Foi muito para mim… Não sei ao certo explicar o que me fez sentir tanta raiva, mas era como se eu não pertencesse aquele lugar (em minha trajetória profissional inclusive, me deparei com casos similares de crianças e adolescentes que sentiram o mesmo que eu havia sentido ao saber da adoção) e essa sensação de não pertencimento, de raiva e até mesmo de não merecimento me acompanhou por muito, muito tempo, aliado também a todo o “boom” que uma adolescente passa.

Eu ainda estava “cega”… A rebeldia, as frustrações, a separação de meus pais, os traumas… Esse misto de ocorridos que geraram sentimentos negativos, ainda não me permitiam ver a beleza da oportunidade que era ter uma família. Precisei atingir a vida adulta… Alias, não! Eu tinha apenas 19 anos… Eu precisei ter me tornado mãe para saber que eu tinha garantido a grande chance quando minha “mainha” me adotou e me fez filha.

Mas meu processo de maturação ainda não tinha atingido estágio de equilíbrio… Eu precisava passar por uma descoberta de mim. Não sei dizer ao certo nem quando, nem como… Mas eu me recordo de ver a minha “mainha” envelhecendo, mas cuidando de todos nós, sozinha como há tempos fazia e algo em mim dizia: “- Você precisa retribuir, porque ela fez muito por ti…” Ahhh! Se fez! Minha mainha, professora, espírita, passou a maior parte de seus dias se dedicando aos outros, através da educação, da doação, da caridade e desta forma ela ia cumprindo sua missão e fazendo muito por si. Aí toda a negatividade tinha aberto espaço para o sentimento de gratidão, de cuidado, de empatia, de admiração, de AMOR. Todos esses sentimentos eram existentes, mas isolados. Surgiam em situações específicas… Mas quando eles se juntaram me transformaram.

Ali estava eu com a minha FAMÍLIA! Os amando e valorizando independente das discordâncias, das caras por vezes emburradas. Isso tudo faz parte das relações. Mas o que você aprende através desses momentos é o que faz toda a diferença. Eu pegava cada rusga e cara torta como aprendizagem. Aprendi a silenciar, a olhar para o outro, a relevar. Sim, eu estava amando! Falo do amor genuíno, que não quer nada em troca, que quer dar mais do que receber porque assim já se faz contente. Por vezes pensei que talvez eu tenha demorado muito para entender todo esse processo. Passei um tempo a me culpar porque queria ter feito mais, queria ter amado mais, retribuído mais… Mas hoje busco conforto em saber que cada um de nós, em nossa missão de vida individual, vivemos o que temos de viver, da forma como foi/é. Que bom que deu tempo!

Hoje sou grata! Percebo a importância dos vínculos que independem do sangue, da carga genética… Histórias que se cruzaram, que seguem firmes, ligadas através da fraternidade.

Sim! Tenho a melhor família, os melhores laços onde buscamos perpetuar todo amor que a nós foi dedicado e o principal, o seu legado de caridade e amor ao próximo! Em homenagem à mulher que me inspirou em vida a ser a cada dia melhor através da solidariedade e doação de amor: Luiza Mascarenhas Lopes Amor.

Jamile Monalisa
Jamille.m.amor@hotmail.com
Insta: @profa.milleamor

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