24/05/2020 Contos de Família
Nós e a espiritualidade
A adolescência é regida pelo movimento de experimentações de diversos sabores e me encontrei nela, de uma forma surpreendente, muitas vezes frustradora, diversas vezes enriquecedora. Hoje, voltando ao passado, analisando a vida, vejo o quão enriquecedor foi esse movimento com meu filho, Victor. Através dele, do seu chamado para o conhecimento do novo, conheci e adentrei na minha religião, minha escolha de vida, que hoje me conduz, sempre com olhar cuidadoso a mim e aos meus, ao outro, fazendo o bem, sem olhar a quem: UMBANDA.
Aos exatos 15 anos, cheio de anseios, desejos, vontades, já frequentando o Terreiro de Umbanda Força e Luz, comandado pela sacerdotisa Romilza Medrado, em fase de desenvolvimento mediúnico, seu chamado pela espiritualidade fez com que meu primigênio, aos 15 anos de idade, carregasse consigo mais dois seres: eu e Bernardo, irmão caçula.
A princípio, cheia de medos, receios e preconceitos movimentados pela falta de estudo, crença errônea de uma Pomba Gira que maltrata, grita, aterroriza, nem perto da minha casa, terreiro, chegava. Até que um dia, 09/09, aniversário do Victor, veio o convite inusitado: ir ao terreiro como presente de mais um ciclo encerrado, conhecer a sacerdotisa e tomar um passe.
Minha reação?
Uau! Que pedido!!! Total loucura. Um turbilhão de informações passaram na minha mente. O medo tomou conta. A primeira resposta foi o não.
Mas lá fui eu!!!
Ao adentrar no terreiro fui literalmente possuída por uma energia inexplicável. Eu não sabia se chorava, orava ou ficava procurando a tal imagem da Pomba Gira, já que meu maior medo era Ela me pegar! Eu confesso que não sei explicar como Ela me pegaria, mas sonhei muito com a mesma na infância e hoje, despida de todo preconceito, falta de estudos, ignorância, a reconheço em minha vida, Pomba Gira Maria Padilha das Sete Encruzilhadas, a que me protege e ampara de todos os males.
Bom, voltando a sensação do primeiro dia, as pernas tremiam, mas o sorriso de Victor ao me ver entrar naquele amplo salão, naquele momento, me fez pensar: valeu!
O cheiro de ervas era simplesmente calmante para todas aquelas sensações e, assim, fui tentando acalmar e confiar. Naquele momento fui recebida pela mãe da casa e posicionada para o passe.
Bernardo foi levado para estar com Victor. Ele também ficou assustado, não queria largar minha calça, mas logo em seguida vi que acalmou ao se encontrar com o irmão.
Começou a gira.
Ah, o passe…
Ao som dos atabaques eu quase desfaleci. Esqueci completamente do medo, da Pomba Gira, só as pernas continuavam tremendo e eu não conseguia parar de olhar para o assentamento Sagrado de Pai Xangô: Curimba, comandada por Gil, Ogã da casa! Quanta batida que fazia tum, tum, tum, em meu coração. A voz forte que puxava os pontos me fez tremer, chorei, chorei demais.
A médium conduzia o passe, pedia para que eu fechasse os olhos, me concentrasse. E eu?
E eu fechava, mas abria assim meio que de cantinho achando que ela não iria ver…e focava na Curimba.
Resultado desse momento que hoje o denomino de CURA?
Adentrei na casa, acolhi a mesma com todo meu amor. Eu e meus filhos, juntos, naquela caminhada, estudando, aprendendo, errando e acertando.
Meu Be, muito pequeno, mexia em todo Conga! Mexia em tudo. Ajudava como cambone. Sempre amado por todos.
Nós três e a espiritualidade. Quanta gratidão.
O desenvolvimento continuou, mas eu sabia onde queria estar: Curimba.
Comecei a fazer aulas particulares de percussão. Aprendi. Minha mãe autorizou a minha entrada nesse solo e assentamento sagrado e cá estou eu! Curimbeira, Ogã, consagrada pela espiritualidade.
A partir daí, comecei com o Curso de Curimba das Meninas, movimento de teoria e prática da Umbanda Sagrada – Curimba, levando conhecimento aos terreiros, filhos de fé (religião Umbanda) e pessoas que simplesmente querem conhecer, aprender a tocar.
A simbologia da família presente neste terreiro é muito, forte, marcante. Lá estão pais, esposas, filhos (eu e os meus), além de construirmos laços e reconhecermos na vivência, dia a dia, com os que estão lá a irmandade, a família que escolhemos no coração, que fazem parte da nossas vidas. E, assim, vamos construindo novos alicerces, nos fortalecendo, conduzindo nossos caminhos sociais, emocionais, em busca da reforma íntima, da evolução enquanto seres sociais pensantes, e nosso propósito de vida na Terra!
Gratidão ao Terreiro de Umbanda Força e Luz. Parabéns a minha mãe no Santo Romilza Medrado.
Fernanda Senna
Professora, mãe, umbandista, curimbeira e ogã consagrada
nanesena@gmail.com