07/11/2018 Construções Sustentáveis
Biocontruções: foco no meio ambiente
Qual o seu critério para escolher uma nova moradia?
Muitos responderão que quer uma casa ou apartamento perto da praia/lago/rio, perto do trabalho, perto do shopping, em condomínio clube, com uma linda vista, próximo a teatros e bibliotecas, em bairro boêmio ou em locais tranquilos e com ambientes relaxantes e meditativos. Mas, independente dos critérios que norteiam nosso desejo, não pensamos a que custo o nosso sonho será realizado.
E o custo dos nossos desejos tem sido muito alto para o planeta.
Segundo dados citados no livro Construção Natural, da série Soluções Sustentáveis (publicação elaborada pelo Ecocentro IPEC – Edição revisada em 2012), as construções consomem 40% dos materiais e recursos gastos anualmente no mundo. Segundo o fundador do IPEC (Instituto de Permacultura e Ecovilas do Cerrado) e referência internacional em sustentabilidade, André Luis Jaeger Soares, 1/4 de toda madeira extraída, 2/5 da energia consumida e 1/6 de toda água potável são consumidos pelo setor de construção. Se formos considerar que estes dados foram levantados em 2012, concluímos que estes números estão piores e crescem à medida que a população mundial e o tipo de construção citado também crescem. E se ainda adicionarmos os fatores emissão de CO2, vemos que a coisa ainda piora.
Pois é amigos, a conta é cara. E, se já estamos pagando, imagina a geração futura?
Então, apresento-lhes uma alternativa: construções naturais ou bioconstruções. Estas surgiram como solução às questões ambientais, por promover o uso de recursos disponíveis no próprio ambiente para construir. Alavancado pelo movimento da Permacultura, as bioconstruções se valem de diversas técnicas para solução de fechamentos, revestimentos, pisos, tratamento de esgoto, reuso de água, entre outras soluções. Tudo para promover um design de ocupação focada em redução do impacto ambiental e promover impacto positivo para o meio natural, proteção do solo, inclusão da natureza, entre outros benefícios.
As técnicas de construção natural utilizam o material mais abundante do nosso planeta, a terra. A terra é utilizada para construção há mais de 10 mil anos pelo homem. Umas das maiores construções feitas pelo homem, a muralha da China, com 21.196 km, tem em sua composição terra compactada. Sendo exemplo de solidez.
As principais técnicas utilizadas para as construções naturais são o adobe, super-adobe, hiperadobe, cob, tijolo de solocimento, taipa leve, taipa de pilão e fardos de palha. Vamos ver um pouco algumas destas técnicas, utilizando como fonte o livro de Construções Naturais.
Adobe – Uma das técnicas de construção mais antigas e populares do mundo. Utilizando terra, fibra vegetal e água, faz-se blocos com formas de madeira, obedecendo o tempo de secagem de pelo menos 3 dias, devendo ser assentados utilizando argamassa feita de terra. Pontos fortes: baixo investimento, usa o material local e não utiliza cimento. Pontos fracos: não pode ser utilizada como parede estrutural e são sensíveis a umidade.
Super-adobe – Desenvolvida nos anos 80 pelo iraniano Nader Khalili, o super-adobe consiste em paredes erguidas em sucessivas camadas de sacos de propileno preenchidos com subsolo, compactados de forma a reduzir os espaços entre as partículas de terra. Arames farpados fazem a aderência entre as camadas. Pontos fortes: fácil execução, rapidez na construção, alta massa térmica, baixo investimento e suas paredes têm função estrutural. Ponto fraco: necessita isolamento com a umidade do solo.
Hiperadobe – O processo é semelhante ao do super-adobe com a diferença que o saco é feito de raschel, o mesmo utilizado em feiras. Estes sacos têm furos que fazem com que as camadas se misturem nas suas áreas de contato, evitando assim o uso de arame farpado e a retirada do saco antes do processo de reboco. Pontos fortes: fácil execução, rapidez na construção, alta massa térmica, baixo investimento e suas paredes têm função estrutural. Ponto fraco: necessita isolamento com a umidade do solo.
Cob – Técnica favorita entre os bioconstrutores, o cob fornece resistência final com paredes autoportantes e possibilidade de inclusão de outros materiais (garrafas por exemplo) durante o processo. Feita com 85% de areia, 15% de argila e fibras vegetais para aumentar a resistência. Pontos fortes: pouco uso de água, uso de material local, possibilidade de modelar objetos nas paredes e larga vida útil. Ponto fraco: processo construtivo lento.
Tijolos de solocimento – Confeccionados em prensas manuais ou pneumáticas os tijolos têm 9 partes de terra para 1 parte de cimento. Pontos fortes: processo construtivo rápido, uso de material local, alta produção em série e não necessita ser queimado para se obter grande resistência.
Taipa de pilão – Técnica de construção com terra crua mais antiga. A terra é apiloada em camadas de 10 a 15 cm, dependendo da altura da forma, formando um bloco monolítico. No Brasil existem casarões, mosteiros e igrejas com mais de 250 anos. Pontos fortes: alta durabilidade e resistência, baixo custo, uso de material local, apresenta paredes lisas e alta massa térmica. Pontos fracos: demora na secagem e necessita proteção contra umidade.
Há ainda outras técnicas como a taipa leve (execução similar a taipa de pilão, porém com adição de fibra vegetal), fardos de palha (paredes de blocos de palha compactados, estruturadas com madeira e revestidos por argamassa de barro), argamassa de reboco sem adição de cimento e construção com uso da madeira.
A maior integração com o ambiente natural da bioconstrução não é o único ponto positivo. A terra crua regula a umidade do ambiente; proporciona conforto térmico, armazenando calor durante o dia e liberando lentamente a noite (paredes de bloco tem variação térmica de 17° a 34° C, enquanto que paredes de terra de 25 cm de espessura variam entre 22° e 28° C); construções em terra crua consomem no máximo 2% de toda energia despendida em uma construção similar em tijolos cozidos e as construções são recicláveis, podendo ser demolidas e refeitas com o mesmo material, após devido tratamento.
Vimos com isso que, podemos fazer diferente. Existem outras formas de ocuparmos o nosso lugar neste planeta.
O fato é que precisamos, enquanto engenheiros e arquitetos pensarmos em projetos de design que não só reduzam o impacto ao meio ambiente, como também incorpore ações que promovam impacto positivo no meio ambiente.
Enquanto seres viventes neste planeta precisamos refletir nossas escolhas, nossos hábitos de consumo e sobretudo a forma como nos relacionamos com o ambiente natural. E a forma como nos relacionamos com o planeta será a forma como nossos filhos irão se relacionar também. Ou seja, podemos mudar a direção (em rota de colisão), para um futuro sustentável.
Ah! A minha resposta para a pergunta que abre este artigo vem da música “casa no campo” dos compositores José Rodrigues Trindade e Luiz Otavio de Melo Carvalho, eternizada na voz de Elis Regina:
Eu quero uma casa no campo
Onde eu possa compor muitos rocks rurais
E tenha somente a certeza
Dos amigos do peito e nada mais
Eu quero uma casa no campo
Onde eu possa ficar no tamanho da paz
E tenha somente a certeza
Dos limites do corpo e nada mais
Eu quero carneiros e cabras
Pastando solenes no meu jardim
Eu quero o silêncio das línguas cansadas
Eu quero a esperança de óculos
E um filho de cuca legal
Eu plantar e colher com a mão
A pimenta e o sal
Eu quero uma casa no campo
Do tamanho ideal, pau a pique e sapê
Onde eu possa plantar meus amigos
Meus discos e livros e nada mais
Gratidão e até a próxima.